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sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

Corno de Veado

Nestes tempos de pandemia que afinal não se sabe se são ou não, recordo um episódio de saúde pessoal.

Teria talvez uns sete ou oito anos, adoeci, já não me lembro muito bem dos sintomas.

Quis o acaso, que morássemos num primeiro andar, cujo rés-do-chão era ocupado por uma farmácia chinesa.

Era um local muito intrigante para nós, crianças. Frascos e frasquinhos, boiões e caixas de todos os tipos, produtos à mostra, outros fechados a sete chaves, mas acima de tudo um cheiro diferente que até nem era desagradável, mas que nada tinha a ver com as farmácias ocidentais.

Não sei de quem partiu a ideia. Consultado que foi o farmacêutico chinês, o “Mestre China”, um respeitável senhor de meia-idade, o diagnóstico foi: papeira.

O passo seguinte, foi o tratamento. Entre uma panóplia de chás, xaropes, pós, óleos, pomadas e outros produtos esquisitos aos olhares dos não iniciados, saiu do fundo de uma gaveta, bem acondicionada, uma ponta de corno de veado. Não me perguntem se era do pai do Bambi, nem a brincar. Tinha visto há pouco tempo o filme e só a sua lembrança me fazia chorar… Sei que o pedaço de ornamento animal foi previamente pesado com todo o cuidado e entregue à minha Mãe com a recomendação expressa de o esfregar vagarosamente, muito poucochinho, com umas gotas de água, no fundo de um prato áspero de modo a formar uma espécie de pasta, com a qual devia aplicar nos lados do meu pescoço, duas vezes por dia.

Do cheiro não me lembro, mas a sensação era fresca e agradável. Uns dias em casa e muita canjinha de galinha e outros miminhos fizeram o resto.

Quando fiquei fino, a sobra do corno lá voltou à farmácia, pesada de novo, paga a diferença de peso (segundo a minha mãe, até nem foi barato…) e acondicionada para outro paciente.

Diz a minha filha mais nova, estudante de Ciências Farmacêuticas, que a papeira mal curada pode provocar esterilidade nos rapazes. Por acaso sabia, mas o facto de já termos descendência vem provar que a terapêutica resultou.

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